Tomb Raider: Trilogia Survivor
Foi em 30 de Dezembro de 2021 que a Epic Games Store deu de graça pra todo mundo que logou aquele dia a trilogia completa do segundo reboot de Tomb Raider. Eu nunca joguei a série original de Tomb Raider, e só joguei um jogo da série Legend — O Guardian of Light. ENTRETANTO, eu joguei Tomb Rider (2013) assim que foi lançado e aquele jogo ficou impresso na minha mente pro resto da minha vida. Porque apesar dele ser um jogo muito bom ele também é uma história extremamente frustrante.
Durante Março e Abril desse ano eu resolvi explorar os outros jogos da série pra ver se o resto da trilogia mantinha-se tão interessante e contraditória quanto o primeiro. E também pra eu procrastinar meus estudos. Essa é minha análise completa da obra.
Spoilers pra todos os jogos a diante.
Tomb Raider (2013)
A partir daqui eu vou me referir ao jogo simplesmente como TR13
Contexto Histórico
2013 foi uma época muito delicada pra história dos videogames. Eu estava no início da minha jornada acadêmica no mundo dos games, seguindo os passos de outras mulheres que estavam começando a ganhar destaque na área. Foi o ano de estreia do programa “Tropes vs. Women in Videogames” da Anita Sarkeesian que provavelmente foi o trabalho de estudos feminista mais famoso do mundo dos games e mais afrontoso contra o machismo quase inerente na comunidade gamer da época. E por mais que todas essas coisas tenham sido boas no ponto de vista da maioria das pessoas, também foi o ano que precedeu o maior surto de machismo coletivo já registrado na história da internet — O Gamergate. Uma das primeiras estratégias de recrutamento neo fascista na internet que não só recrutou vários homens pro mundo da extrema direita como arruinou a vida de várias mulheres na indústria e na mídia de games.
Como outros trabalhos com o viés feminista feminista da época, TR13 buscava recriar a Lara Croft — protagonista da série. Desde que ela foi criada em 1996 basicamente tudo que se discutia sobre quem é Lara Croft se baseava no tamanho dos seus peitos como aponta o artigo de Aja Romano para a Vox em 2018 intitulado “porque estamos discutindo Lara Croft à duas décadas”. E em contra partida, a produção de TR13 convocou a ilustre roteirista e Game-Writer Rhianna Pratchett para recriar essa Lara. E o objetivo era claro: Tirar o foco da caracterização dessa personagem do tamanho dos seus peitos e colocar foco nos seus conflitos internos. Transformar ela em uma “mulher real” por assim dizer.
E ela e o resto da equipe realmente conseguiu recriar essa Lara Croft. Hoje em dia quando a gente pensa em Lara Croft, arcos e flechas tem vindo em mente bem mais rápido que as duas pistolas das séries antigas. Entretanto a noção de “realismo” de estadounidenses costuma ser um pouco… Violenta demais.
Premissa
TR13 começa com o naufrágio de um navio que deixa toda a sua tripulação isolada em uma ilha inabitada em algum lugar ao leste do Japão, no “triângulo do diabo”. Bom, acontece que esse navio estava de fato velejando em direção de Yamatai. A tripulação só não esperava que as tempestades ao redor da ilha não fossem tão perigosas quanto sugeriam as lendas.
O objetivo dessa tripulação era realizar uma expedição arqueológica na ilha, a fim de descobrir a verdade sobre a lenda da rainha-bruxa Himiko que tinha poderes extraordinários tais quais controlar o tempo e o segredo da imortalidade. E além disso, toda a expedição também seria documentada em vídeo para aparecer no programa de TV de arqueologia pop chamado “Whitman’s World”.
Além da Lara, a tripulação também contava com Roth, o capitão do navio; Alex, o menino dos computador; Joslin, a mecânica; Jonah, o cozinheiro; Grim, o marinheiro; Dr. James Whitman, líder da expedição e apresentador do programa “Whitman’s World”; e Sam, a cinegrafista.
Depois do naufrágio a Lara se dedica a reunir seus colegas de tripulação e dar um jeito de sair da ilha… Mas ninguém sai de Yamatai, seja vivo ou morto. Como se não fosse o suficiente, outros náufragos moram nessa ilha, formando um culto à Himiko que tem um grande interesse em capturar um dos membros da tripulação e matar todos os outros que tentem à resgatar.
É uma parada meio Far Cry / Apocalypse Now. Com todo mundo ficando mais e mais biruta ao tentar sobreviver nessa ilha onde a própria natureza parece querer matá-los.
Jogabilidade
Ugh. Eu não quero usar termos em inglês pra essas análises. Como eu chamo “gameplay loop” em português? Ciclo lúdico? Vai ser Ciclo lúdico. Eu não faço ideia de como outros autores chamam. Todo mundo no youtube só usa os termos inglês.
Enfim, o ciclo lúdico desse jogo é um pouco esquisito. O mundo do jogo tem pequenas áreas abertas onde você pode fazer coisas relacionadas a sobrevivência, como catar plantinhas e caçar animais, além de simplesmente poder explorar. Essas pequenas áreas abertas são ligadas por corredores de cenas fixas as quais você deve ultrapassar fazendo o que o jogo quer que você faça. Seções lineares, se você já entende um pouco de estrutura de videogame. Toda a história do jogo acontece nessas seções lineares, e as áreas abertas são quando a historia do jogo “pausa” pra você explorar.
Assim nós temos dois ciclos lúdicos, um independente do outro e sem muita capacidade de afetar o outro. Quando você está nessas fases de exploração livre suas principais recompensas são descobrir detalhes da história e do mundo paralelos à trama principal, como achar documentos, diários e artefatos espalhados por aí. Mas essa pausa pra sair passeando por aí não faz muito sentido com o que acontece na Trama principal, porque a Lara sempre precisa fazer alguma coisa urgente pois a prioridade dela é salvar seus amigos e sair da ilha. Ela sair atrás de máscaras de teatro japonês antigas não ajuda em nada no seu objetivo principal. Eu entenderia essa necessidade de parar a trama um pouco pra explorar se o objetivo do jogo era vender a fantasia de ser uma arqueóloga no estilo Indiana Jones, mas na trama desse jogo o fato da Lara ser uma arqueóloga é secundário em relação a ela ser uma sobrevivente.
Essas seções de pausa da trama também não vendem a fantasia de sobrevivência. Elas vendem apenas a estética. Num jogo de sobrevivência você geralmente precisa achar comida e água, lugares seguros pra dormir, formas de fazer fogueiras e várias outras coisas para de fato sobreviver. A natureza costuma ser seu antagonista nesses jogos, mas nas seções abertas de TR13 você corre 0 risco de morrer. Você não vai morrer de fome, nem de sede, nem de frio ou doença. O único objetivo que você tem para ir atrás de frutas e caçar animais é melhorar seus equipamentos, o que é totalmente opcional já que você pode terminar o jogo usando apenas o seu arco inicial. Não existe sobrevivência aqui.
A principal característica das seções abertas de TR13 provavelmente é a habilidade de encontrar “tumbas” pra você “saquear” (o nome do jogo afinal é Tomb Raider, saqueadora de tumbas). Mas assim… Se esse é o título do jogo eu esperava que as tais tumbas fossem um pouco mais complexas e compridas. Mas acabam sendo a parte mais fácil do jogo que, mais uma vez, é completamente inconsequente em relação à trama principal.
Em compensação, as seções lineares são muito bem escritas e desenhadas com vários tipos diferentes de desafios pra você superar. Hora você terá que manter-se escondida do culto da Himiko. Hora, terá que sair pulando por terreno instável enquanto o chão literalmente cai por onde você pisa. E hora você terá que resolver um quebra cabeças em uma catacumba cheia de armadilhas com mecanismos impossíveis. E nessas seções lineares é onde realmente se encontra a temática de sobrevivência em forma de jogo. Com frequência o seu maior inimigo nessas seções será a própria natureza enquanto você tenta, por exemplo, sobreviver ser arrastada pela correnteza de um rio mortal. E, como foi sugerido na premissa do jogo, não é só com a natureza que a Lara tem que se preocupar. Também tem os outros náufragos que já estão completamente birutas.
As consequências para os seus erros, nesse jogo, são absolutamente brutais. Não contigo — sempre que tu “morre” tu pode tentar de novo imediatamente — , mas com a Lara. Erre um pulo qualquer e você verá uma imagem extremamente gráfica do rosto da Lara sendo empalado por uma estaca de madeira no chão. Não saia da água a tempo e você verá a Lara agonizando enquanto se afoga. Não desvie daquela pedra e… Bom você entendeu. Morte nesse jogo é tão inconsequente quanto em qualquer outro jogo, mas muito mais violenta do que você provavelmente está acostumado.
Tudo nesse jogo é extremamente violento. Um dos primeiros contatos da Lara com um membro do culto é uma cena de assédio sexual que certamente terminaria num estupro se ela não matasse o cara. Assim eu acabo percebendo que talvez a mensagem central da mensagem do jogo não seja explorar o quão difícil é sobreviver — afinal, como observamos anteriormente isso é extremamente trivial — , mas sim até onde a Lara é capaz de chegar em nome da sobrevivência. Em outras palavras: Quanta violência a Lara deve cometer para que violências não sejam cometidas contra ela e os seus?
A primeira vez que a Lara mata alguém ela fica absolutamente chocada, mas assim que ela tem que matar de novo ela encontra a capacidade de puxar o dedo do gatilho sem qualquer hesitação.
Entre uma seção e outra, a Lara parará para refletir nos seus atos e ela fica claramente afetada por toda a violência que ela tem que cometer, mas que outra escolha ela tem? Com o tempo o que ela descobre quanto a isso é apenas que, quanto mais você mata, mais fácil fica matar.
Os amigos dela mantém ela segura na sua humanidade, entretanto. Eles a lembrar que ela só está fazendo o que ela tem que fazer e que ela não é realmente uma assassina. Mas será? Ela é realmente muito boa e eficiente quando se trata de tirar a vida dos outros…
A tripulação
A caracterização da tripulação é muito boa. Quem já era amigo da Lara cria um laço ainda mais forte com ela, e quem era só um colega vira um amigo pro resto da vida, exceto por quem morre (obviamente) e pela Sam.
São essas personagens que fazem o jogo valer a pena, na minha opinião. Ter que sobreviver a essa coisa toda deixa eles todos extremamente traumatizados e estressados, mas também estreita seus laços como mais nada conseguiria. Algumas dessas personagens são mais interessantes que outras, entretanto.
A princípio eu amo odiar o Dr. Whitman. Ele é um homem minúsculo que tem sucesso na sua carreira simplesmente por ser homem. A Lara é uma arqueóloga muito mais competente que ele, mas é ela quem é a assistente dele. E ele se sente extremamente intimidado pelo talento da Lara. A toda hora ele precisa lembrar os outros que ELE é o líder da expedição, mas ele é completamente incapaz de liderar qualquer coisa. Antes deles se conhecerem a Lara via ele como um herói, mas nossos heróis costumam agir de maneira muito diferente na frente e atrás das câmeras, não? Ele é covarde, mesquinho, egoísta e facilmente manipulável. Quando o pessoal do culto resolve tratar ele como importante pra que ele traia o resto da tripulação ele aceita sem nem hesitar, tamanhas são as fraquezas do doutor “white man”. Tenho certeza que o nome foi de propósito.
O Alex é outro homem que se sente intimidado pela coragem e habilidade da Lara, mas de um jeito bem mais inocente. O coitado não tem oportunidade de fazer muita coisa porque ele é o cara dos computadores numa ilha isolada da civilização e se sente ainda mais inútil perto da Lara nessa situação onde as habilidades dele não tem qualquer utilidade. Mas em vez da sua insegurança levar ele a fazer mal caratisse como o Dr. Whitman, ela o leva a fazer burrices bem intencionadas. O coitado infelizmente acaba morto em uma dessas burrices ao tentar provar que ele não é tão inútil quanto ele mesmo imagina que é. Ele é um dos poucos personagens que já era amigo da Lara antes da expedição começar, e ele era claramente querido por ela e pelo resto da tripulação, mas nada disso silenciava as suas próprias inseguranças.
O Roth pra mim não era um personagem muito interessante. Tanto a mãe quanto o pai na Lara morreram muito antes dos eventos do jogo, e o Roth servia como uma figura paterna. A parte mais interessante quanto a sua personagem, pra mim, é a sua relação com a Lara e com a Joslin. O Roth morre bem no começo do jogo protegendo a Lara de um dos membros do culto e o resto da tripulação encontra os dois logo depois do ocorrido. A Joslin então guarda um sentimento que ela nunca fala em voz alta durante o jogo, mas fica claro nas suas ações e nos documentos que você encontra pela ilha durante as partes de exploração.
Acontece que o Roth e a Joslin tem uma filha juntos. A Joslin criou a menina sozinha e nunca contou pro Roth, mas ela claramente tem sentimentos por ele. E desse momento em diante até perto do final do jogo ela guarda rancor da Lara por ter a impressão de que foi ela quem matou a pessoa que ela amava. Ela leva bastante tempo pra conseguir conversar com a Lara direito, mas depois de bastante trabalho em equipe ela consegue deixar o seu rancor de lado. E é impressionante o quanto isso fica exposto sem a personagem admitir nada disso em diálogo.
Por fim, o Jonah é o exemplo de masculinidade saudável do grupo. Ele é um homem grandão e carinhoso que sempre tenta remediar os conflitos que surgem dentro do grupo e sempre trabalha pra manter todos os membros da tripulação o mais calmos possível. Ele até dá várias chances pro Dr. Whitman se redimir apesar dele OBVIAMENTE ser um traidor. Ele sempre espera o melhor de todo mundo sempre e tenta guiar os outros a fazer o mesmo. Ele é um fofo.
Sobre o Grim eu sinceramente não tenho muito o que falar… Ele é um véio escocês bom de briga. É isso.
Mas e sobre a Sam? Bom, considerando que a trama principal é sobre o relacionamento da Sam com a Lara elas vão precisar do seu próprio subcapítulo.
Sam & Lara
Ao contrário da maioria das pessoas na internet, eu não acredito que a Lara e a Sam deveriam ter terminado o jogo como um casal. Não, eu acredito que as intenções dos desenvolvedores por trás deste relacionamento era bem mais gay do que só duas mulheres se beijando no final. Ou mais persistentemente gay pelo menos.
Como assim? Bom, pra mim tudo ao redor delas indica o fato de que elas deveria ter sido namoradas desde antes do jogo começar, mas isso foi de alguma forma cortado pela Square Enix — Distribuidora do jogo e então dona da propriedade intelectual Tomb Raider.
Pensa comigo: TODOS os amigos da Lara estão em perigo. Roth, Alex, Jonah… Mas a sua prioridade no jogo todo é sempre a Sam. Sempre que ela se encontra com algum dos membros da tripulação na ilha ela pergunta se viram a Sam. Quando ela encontra o resto da tripulação ela está sempre aliviada feliz deles estarem bem, mas eles raramente se tocam — o que é normal pra videogames da época já que animar personagens se tocando era particularmente difícil. Mas apesar dessa dificuldade os desenvolvedores resolveram que valeria a pena passar por esse desafio para que a Sam e a Lara não apenas se tocassem, mas se abraçassem por momentos longos (pro padrão videogame) e emocionalmente gratificantes. Sim, a Lara se importa com toda a tripulação, mas é apenas para os braços da Sam que ela se joga em alívio dramático como se finalmente tivesse encontrado seu porto seguro no meio desse inferno tropical.
Quase como em uma piada, a narrativa paralela do jogo tenta nos convencer que Sam e Lara são “melhores amigas” quando a evidência mostra que há algo muito mais romântico envolvido aí. Assim como historiadores olhando para fotografias de mulheres que moravam juntas dando as mãos ou se abraçando e dizendo que elas eram apenas “boas amigas”.
Bem no início do Jogo a Lara encontra a câmera da Sam que ainda tem alguns vídeos gravados na sua memória. Todos os membros da tripulação aparecem nos vídeos, e em teoria o Dr. Whitman deveria ser o protagonista deste documentário. Vendo as imagens não editadas fica claro o quanto a Sam acha frustrante gravar o doutor, e quer ela esteja consciente disso ou não o foco da sua câmera sempre acaba caindo no rosto de Lara. Os olhos da Sam podem estar tentando focar no seu trabalho, mas ela não consegue deixar de gastar alguns segundos de vídeo só pra registrar a Lara olhando o horizonte. Isso, meus amores, é comportamento de sapatão apaixonada.
Se é possível ver através dos eventos do jogo que a Lara sempre prioriza a Sam e sempre fica mais feliz ao ver ela do que o resto da tripulação, e se é possível ver que a Sam sempre acaba olhando sua “melhor amiga” com uma admiração quase acidental… Como não concluir que as duas já se encontram em um relacionamento? E não qualquer tipo de relacionamento, mas um extremamente monogâmico que coloca o par romântico sobre as suas outras amizades.
Lembram da burrice que acaba deixando o Alex morto? É no decorrer da missão na qual você tenta salvá-lo, mas fracassa, que o jogo tenta diminuir sua própria linguagem visual / corporal das personagens pra dizer de uma vez por todas que sim, Sam e Lara são só amigas.
Lá você encontra um diário da Sam dizendo que ela gostava de levar a Lara em festas pra elas paquerarem rapazes. O que significa, então, quando a Lara nessa mesma missão falha em salvar a vida de um rapaz o qual ela sabia que era apaixonado por ela? A morte do Alex é tão desconfortável quando você pensa nisso. Ele finalmente admite pra Lara o quanto queria chamar a atenção dela e ressente o fato de apenas ter conseguido isso na hora da sua morte. O rapaz está praticamente se suicidando durante a cena ao atirar nos vilões sem levar em consideração os tanques explosivos ao seu redor. Ela não sabe o que fazer pra salvá-lo e no seu desespero de ao menos *tentar* fazer alguma coisa ela o beija… Na bochecha. Eu odeio essa cena. Mas observando-a a partir dessa leitura de “era pra ser gay mas a gente teve que contornar as censuras da squenix” isso pareceu pra mim o embate final entre essas duas forças pro trás do desenvolvimento do jogo. Por um lado, a Squenix exige prova da heterossexualidade de Lara e Sam na forma do tal diário. Mas por outro os desenvolvedores colocam o último prego no caixão da heterossexualidade dela negando o beijo na boca entre a Lara e um homem.
Depois disso a Sam é sequestrada (pela milionésima vez) e no maior estilo Mario salva Peach inicia-se a última missão do jogo.
O vilão que ninguém liga (Mathias) precisa da Sam pois ela é decendente da rainha Himiko, e o seu plano é transferir a alma de Himiko para o corpo de Sam e assim revivê-la para que ele possa serví-la eternamente… Ou qualquer baboseira assim. O importante aqui é: Pra realizar esse ritual, ele resolveu colocar a Sam num vestido branco com uma porra de uma coroa de flores.
Lara sobre a montanha, enfrenta exércitos de inimigos, mata o vilão que ninguém liga, impede o espírito de Himiko de possuir o corpo da Sam, e depois de literalmente parar uma tempestade na base do tiro… Só Lara e Sam estão vivas no topo da torre. Com a Sam jogada ao chão, Lara corre em sua direção para colocá-la em seus braços como quem pega a sua noiva do chão após ela ter tropeçado. “ O que está acontecendo?” pergunta Sam, desorientada.
“Shh, shh… Eu to aqui.” assegura Lara. “Você tá segura agora. Tá tudo bem.”
“Você me salvou… Eu sabia que me salvaria” responde Sam aliviada.
“Eu te prometi não foi? Vamos pra casa”. E com essas palavras o céu se abre, e os raios de Sol caem diretamente sobre as duas, como se Deus estivesse sacramentando seu casamento.
Se isso não é gay, eu não sei o que é. E o fato de que o resto da franquia simplesmente finge que a Sam não existe enche o meu coração de ódio e frustração.
Rise of The Tomb Raider
A nova fase da franquia, agora nomeada “trilogia Survivor” continuou em gibis e em outros jogos, o segundo deles lançado em 2015 e intitulado “Rise of The Tomb Raider”. Infelizmente, Rise sofre da síndrome de tentar agradar todo mundo e não agradar ninguém no processo.
Narrativa
Claramente alguém não ficou feliz com a temática homossexual de TR13, pois aqui a Sam é apenas mencionada uma vez e depois esquecida para sempre.
Eu me lembro que na época que saiu TR13, leituras feministas da obra criticavam o fato de que a Lara era uma máquina de matar e que matar outros seres humanos não parecia ter tanto impacto em sua psique. A premissa por trás de Rise parece ter sido uma resposta a isso: As experiências traumáticas da Lara em Yamatai deixaram ela completamente pirada das ideia e desde então ela tem se colocado em situações desnecessariamente perigosas e violentas porque ela ficou viciada na parada. Ela tenta justificar seu comportamento errático dizendo que ela faz isso pra continuar as pesquisas do seu pai sobre imortalidade, mas, aparentemente, ninguém engole isso e a única pessoa que teve paciência pra continuar sendo amigo da Lara nesse meio tempo foi o Jonah — o cozinheiro good vibes do TR13.
Isso também, entretanto, foi usado como justificativa para alinhar os sentimentos da Lara com as reclamações machistas de que ela era “muito chorona” no jogo de 2013.
Pois bem. Ela não tem amigos. Procura perigo só por procurar. Vamos transformar ela em um robô! Robô pega mal? Okay, então vamos só fazer ela virar uma heroína de ação genérica que só chuta bunda de bandidos, mata espécies em extinção, e destrói sítios arqueológicos! Igual ela era nos jogos clássicos.
E bom… Como agora ela não está só sobrevivendo, o jogo precisa de vilões de verdade. Então tiraram uma organização paramilitar secreta do cu pra antagonizar a nossa Lara. “Trinity”. Trindade na tradução brasileira.
A história envolve o fato de que essa Trindade está atrás da “Fonte Divina” que é um artefato que da imortalidade pras pessoas. Por que a trindade quer isso? Pra salvar… A vida… De uma mulher com câncer de pulmão? A tal mulher com câncer é madrasta da Lara ou algum outro tipo de… Quase familiar. Não fica muito claro qual a relação delas, sinceramente. O fato é que ela só se relacionou com a família Croft pra pegar a pesquisa do pai da Lara sobre a tal Fonte Divina. O que é… Muito aleatório. O nome dela é Ana. Acho que é mais fácil chamar ela pelo nome do que dizer “mulher com câncer de pulmão” toda vez, mas sinceramente parece que o câncer e o fato dela ser uma traíra são os únicos traços de personalidade dela. A mulher tá morrendo e mesmo assim ela não para de acender a porra do cigarro.
E aí ajudando a Ana tem um rapaz chamado Constantin que é um fanático religioso completamente maluco que por algum motivo tem feridas constantemente abertas nas duas mãos assim como cristo depois de ressuscitado.
Sinceramente eu tenho um pouco de dificuldade de tirar uma leitura interessante de Rise porque essa narrativa é tão chata. A Lara não tem nenhum envolvimento emocional no que tá acontecendo, ela nem parece surpresa com o fato da Ana ser traíra, e no breve momento em que o Jonah — a única pessoa que teoricamente ainda é amigo da Lara — aparece na trama ele só serve de donzela em perigo por 10 minutos.
Não tem nada importante nem interessante acontecendo aqui. E só pra fechar a rodada de reclamações: A primeira área aberta do jogo é um Gulag! Então se prepare pra vários minutos de propaganda anti comunista até você conseguir explorar umas tumbas de verdade.
Jogabilidade
Assim com TR13, existe uma contradição inerente na estrutura do jogo com relação ao que você faz e o que a história conta. Mas enquanto TR13 tinha a jogabilidade como elo mais fraco e a narrativa como elo mais forte, em Rise acontece o oposto. Aqui a Jogabilidade é infinitamente mais interessante que a narrativa.
O espaço de jogo continua sendo dividido em várias áreas abertas com corredores narrativos conectando-as, mas dessa vez eles são bem mais interessantes e não tentam vender a fantasia do sobrevivente. O jogo sabe, você sabe, todo mundo sabe que a Lara Croft é uma mulher fodona que sobrevive qualquer coisa, então essa é a fantasia da vez. Tomar riscos desnecessários só porque é legal.
Enquanto TR13 tinha tumbas curtas e pouco interessantes, Rise introduz dois tipos de “masmorras” diferentes. Criptas funcionam como as tumbas de TR13: Quebra cabeças simples pra conseguir recompensas menores.
Por outro lado as Tumbas de Rise são muito mais interessantes. São salas com mecanismos extremamente complexos que você deve navegar estrategicamente para conseguir as recompensas no final. E as recompensas são imediatamente gratificantes: Você desbloqueia uma nova habilidade que pode deixar a exploração ou o combate mais dinâmicos.
E apesar de todo o anti comunismo, é muito interessante explorar o Gulag e ver algumas instalações modernas sendo tratadas como tumbas históricas de um império antigo. E a união soviética era de fato um império quando você está olhando desse ponto de vista arqueológico.
Além disso o jogo tem side quests, que são inconsequentes pra história mas são pequenos desafios interessantes pra ver se as suas habilidades gamers estão afiadas.
Infelizmente, pra você aproveitar todas essas partes bem feitas do jogo você PRECISA ignorar a trama principal.
O tempo todo tem inimigos chegando, alguém em perigo, alguém morrendo… Mas só se você decidir avançar a história. Um dos seus aliados pode estar no bico do corvo e te chamar no walkie talkie desesperado pedindo ajuda imediata, mas se você quer aproveitar a parte boa de verdade do jogo você terá que ignorar a urgência da narrativa e deixar seu amigo morrendo por alguns minutos antes de decidir ir atrás dele de verdade.
Conclusão? (Já?)
Rise of The Tomb Raider é um jogo sem qualquer noção de ritmo, onde a narrativa ruim fica o tempo todo atropelando o que poderia ser um jogo bom, mas que por causa desses problemas fica preso à mediocridade.
Eu sinceramente não tenho mais o que falar sobre. Próximo?
Tomb Raider (2018)
Antes de falar do terceiro jogo da franquia eu quero falar do filme que saiu mais ou menos junto dele.
Tomb Raider (2018), ou simplesmente TR18 é uma adaptação de Tomb Raider 2013, então é a mesma história lá envolvendo Yamatai. Esse é um filme muito bom, mas como adaptação ele tem um problema…
A Sam não existe.
Na verdade nenhum dos membros da tripulação existe. Mas será que isso é realmente um problema? Eu queria muito ver lésbicas sobreviventes na telona, mas se não aconteceu nem nos jogos, como ia acontecer no filme?
Apesar da falta de arco-íris, o filme toma vantagem da inexistência da personagem pra criar uma história mais coesa com todos os elementos dos jogos que eles emprestaram.
A Lara de Alicia Vikander não é a filhinha de papai dos jogos. Ela é uma moça rebelde, irreverente, com uma forte vibe bissexual ao seu redor. E mesmo tendo uma personalidade diferente ela captura uma energia da personagem que nenhum dos jogos explora. De algum jeito essa Lara Croft parece muito mais alegre e contente com a sua vida do que a dos jogos, e muito menos traumatizada.
Ela é perceptivelmente a Lara Croft, só que diferente. E eu acho que esse é o marco principal de uma boa adaptação.
Eu não tenho uma análise profunda sobre o filme além disso. É um filme de ação e aventura com uma mulher bonita sendo foda, e eu pelo menos não preciso de mais nada além disso.
Além do que filme não é minha especialidade, eu so mais de jogo memo.
Shadow of The Tomb Raider
Shadow é melhor que Rise? É.
É melhor que TR13? Nem fudendo.
Eu tenho que admitir que depois de passar tanto tempo olhando pra essa mulher, eu desenvolvi uma crush pesada na personagem. E se me permitem… Babar ovo pra mulher bonita por um segundo, se eu for classificar os jogos pelo quão atraente está a Lara pras minhas pobres sensibilidades sáficas, Shadow ganha de lavada.
Narrativa
Shadow começa de maneira fenomenal. Ela aparentemente conseguiu criar uma relação saudável com o Jonah enquanto os dois se unem pra atrapalhar os planos de dominação mundial da Trindade. E apesar da vida deles agora ser basicamente caçar a Trindade o Jonah deu um jeito de tirar a Lara do seu caminho de auto destruição. O único problema que falta resolver na relação deles é que a Lara aparentemente desenvolveu o ego do tamanho de Júpiter agora que ela já tem experiência em frustrar os planos de uma das organizações paramilitares mais poderosas do mundo.
A história de Shadow começa com a busca da Lara e da Trindade por dois artefatos maias relacionados com o fim do mundo. Sem entender direito como esses artefatos funcionam, entretanto, quando a Lara consegue achar um deles ela acaba sem querer engatilhando o fim do mundo, e causando um Tsunami na cidade onde ela e Jonah estavam junto com uma série de outros desastres naturais.
Depois do grosso do tsunami ter passado e a água voltado, a Lara começa a se culpar pelo ocorrido e entrar num surto de auto piedade com auto engrandecimento onde ela é a única pessoa q pode salvar o mundo. E enquanto ela tá surtando, o Jonah se vê obrigado a ser duro com sua amiga. “O mundo não gira ao seu redor, Lara!” Ele diz, falando pra ela que eles não vão salvar o mundo porra nenhuma enquanto eles não ajudarem as vitimas do Tsunami que eles podem ajudar aqui e agora.
Essa é a relação que se desenvolve no decorrer do jogo. A Lara fazendo todas pirueta, exploração e combate, enquanto o Jonah segura ela no mundo real e nos problemas reais.
Numa das minhas cenas favoritas da série toda a Lara lamenta ter perdido todos os seus amigos desde Yamatai, mas agradece por ainda ter o Jonah na sua vida.
Esses dois se amam. E é um amor muito diferente do que rolava em TR13 entre Lara e Sam. Esses dois aqui passaram pelo inferno juntos e continuam juntos, confiando de um jeito que só amizades muito profundas conseguem confiar. Não tem nada a ver com estar apaixonado, olhar de um jeito especial, ou coisa assim. É um amor construído com o tempo, de confiança inabalável. E por mais que eu goste de romance e quisesse ter visto o romance das duas rolar lá no outro jogo, eu admiro muito mais o que a Lara e o Jonah tem aqui.
Infelizmente o jogo desanda muito rápido.
O outro artefato maia que eles tem que encontrar está em algum lugar da floresta amazônica. Eu vou dar um minuto pros latino americanos suspirarem.
Pelo menos o jogo parece saber o quanto isso é absurdo, especialmente quando o lugar específico da floresta onde se encontra tal artefato é o Peru.
Eu tenho que admitir que não conheço a história dos impérios ameríndios direito, talvez Incas e Maias tenham tido algum contato séculos atrás que justifique a localização do artefato, mas a impressão que me passa daqui do Brasil é que esses gringos pegaram as culturas ameríndias que chegaram a formar civilizações imperialistas e jogaram tudo no mesmo balaio como se fosse tudo a mesma coisa.
Porque você não encontra só elementos maias e incas misturados por aí, também tem coisa asteca no meio que não tem nada a ver com a história.
E essa nem é a parte mais confusa da história, mas eu vou chegar lá.
A estrutura do espaço de jogo é a mesma dos anteriores: áreas abertas conectadas por corredores narrativos.
A primeira metade desses corredores narrativos são realmente coisa de deixar o coração acelerado. Com uma ação muito boa, invocando sentimentos muito fortes. Então se você for como eu, vai acabar ignorando as estranhezas do plot por que a montanha russa de emoções pela qual Jonah e Lara passam vale muito a pena.
Quando um general da Trindade mente pra Lara sobre ter matado o Jonah e ela sai da água com o mundo explodindo ao seu redor pronta pra matar cada fdp q trabalha ou já trabalhou pra Trindade eu fiquei completamente arrepiada e tanto tomada de empolgação pelo combate que viria quanto de ódio por terem matado *meu melhor amigo*.
Só que depois de um certo ponto… o jogo esquece o desenvolvimento emocional da Lara e do Jonah. Esquece das cenas emocionantes. E vira Rise of The Tomb Raider parte 2. Só que… chato.
O rolê todo deles irem pro Peru é que a Trindade tava calculando errado a localização do artefato. Eles estavam procurando a tal cidade perdida que guardaria o artefato no Brasil, quando ela na verdade está no Peru.
O líder da Trindade da vez que estaria perseguindo a Lara pra encontrar a cidade perdida é o Dr. Pedro Dominguez. E pode parecer estranho eu falar da aparência dele, mas ele é um latinoamericano médio. Pele escura, cabelo cabelo ondulado, barba.
Acontece, que quando a Lara descobre a tal cidade perdida, ela vê que se trata de uma comunidade maia isolada do resto do mundo. Como se não fosse o suficiente, ela descobre que o tal Dr. Dominguez nasceu na cidade perdida! E ele justifica toda a vilania dele como sendo necessária pra proteger a cidade perdida de colonizadores.
Mas… Se o Dr. Dominguez sabe que é o artefato perdido está na cidade perdida, porque a trindade teve que seguir a lara pra descobrir isso? Porque eles se quer foram tentar procurar qualquer coisa no Brasil quando o líder deles nasceu na porra do lugar?
E ele nem parece maia! Se ele fosse um Maia de fato do méxico que teve contato com outras etnias eu entenderia, mas essa sociedade ficou supostamente isolada por milênios sem contato com outras etnias. Por que que o cara é pardo? Ele é literalmente a única pessoa que tem barba na cidade perdida inteira!
Quando a Lara chega na cidade perdida também é quando todo o envolvimento emocional da trama para, e dá lugar pra essa… Busca sem sentido por artefatos fora do lugar. Ele tenta criar uma narrativa anti colonial a partir daí, mas parece muito com o colonizador tentando falar sobre anti colonialismo quando toda a sua visão de mundo é baseada em colonizar outras culturas.
É quase como se esse grupo de maias (que só pra reforçar, continuam no lugar errado) não fosse capaz de decidir o próprio futuro e precisa de pessoas de fora — a Lara — pra se proteger de outras pessoas de fora — a Trindade. Roubando qualquer soberania que esse povo indígena pudesse ter.
A líder da comunidade, rainha Unuratu, é a pessoa que indica o que a Lara deve ou não fazer, mas ainda me causa desconforto a branca no meio de Maias isolados usando suas roupas e conversando com todos eles EM INGLÊS.
Mas pra mim o jogo morreu mesmo quando eu fui atacada por uma matilha de lobos-guará. Aquilo foi demais pra mim.
Jogabilidade
Tudo em Shadow, apesar da premissa estranha de tumbas maias e astecas no meio do Peru, é maior e melhor que Rise. As armas tem mais impacto, as seções de furtividade tem mais opções, as tumbas são maiores, mais complexas e em maior número.
Além disso a narrativa de dá pausas apropriadas pra você sair explorando tanto quanto seu coração mandar e encontrar todas as maravilhas e perigos que a floresta amazônica oferece.
O seu primeiro confronto com um animal silvestre nesse jogo é contra uma onça, e eu acho que nunca vi um bicho real tão imponente quanto essa onça. Quando ela apareceu, na verdade, foi uma cena tão impactante que eu achei que essa onça seria um inimigo recorrente, sempre a um passo de pegar a Lara de surpresa, mas você mata ela depois de pouco tempo.
Ainda assim, as side quests, tumbas e criptas são muito divertidas… até você chegar na cidade perdida.
Quando tu finalmente chega lá parece que tu vira o correio da cidade, e apesar de ter muita coisa pra você fazer na cidade… Nenhuma dessas coisas é interessante.
Conclusão
Shadow começa tão bem. A jogabilidade é boa, a estrutura das fases é boa, ele tem um bom ritmo… Mas aí tu chega na tal cidade e tudo para.
Seu envolvimento emocional para, as cenas de ação legais param, as tumbas boas e exploração divertida… Tudo que antes estava sendo fenomenal fica pior que medíocre: Fica entediante.
Então eu não sei o que pensar sobre Shadow. Por um lado é muito bom, mas por outro é simplesmente chato. Acho que o jeito é aceitar a contradição e seguir em frente.
A trilogia como um todo
E essa é a questão da trilogia toda não é? Altos bem altos, baixos bem baixos. Shadow de alguma forma condensa a experiência de jogar TR13 e Rise um seguido do outro: Começo envolvente, final entediante.
Acho que se a Crystal Dynamics, estúdio de desenvolvimento dos jogos, tivesse a chance de fazer um quarto jogo eles conseguiriam fazer algo realmente fenomenal. Shadow chegou tão perto da grandeza. Com um pouco mais de insistência talvez essa série entrasse pra história.
Mas como as coisas estão, TR13 continuará sendo o único jogo dessa continuidade considerado um clássico por ter mostrado ao resto do mundo dos jogos o tipo de protagonista que poderíamos ter se ousássemos um pouco mais. E infelizmente as sequências não conseguiram ousar tanto quanto aquele primeiro sucesso.
Ainda assim, me pego no final da minha jornada perdidamente apaixonada pela Lara Croft, e esperançosa para ver o que a Crystal Dynamics pode fazer agora que está aliada com a Amazon Games. Se deus for bom eles vão ser menos tiranos com relação a sexualidade da Lara e e finalmente verei minha waifu beijando mulheres sem ser fanfic/fanart.